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sexta-feira, 27 de julho de 2012

APAGÃO PARANAENSE

Por Maurício Oliveira

Em Curitiba e arredores, já se foi o tempo em que profissional cobiçado era apenas quem apresentasse uma série de credenciais: boas referências, formação sólida, cursos de especialização no currículo. Hoje, em fase de pleno emprego, até pessoas sem experiência e qualificação estão sendo disputadas acirradamente por setores em expansão, que precisam preencher vagas nos cargos mais básicos. “Nos últimos dois anos, a oferta de trabalho na região vem crescendo sistematicamente em ritmo superior ao do aumento da população. Isso leva à escassez de mão de obra, que vem sendo percebida no mercado”, analisa o sociólogo Paulo Delgado, pesquisador do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), órgão de pesquisa ligado à Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral. “E não há qualquer sinal de reversão desse quadro em curto prazo.”

O mesmo problema vem sendo percebido nos últimos meses em várias grandes cidades brasileiras, mas não é por acaso que parece mais agudo na capital paranaense. A região metropolitana de Curitiba se destaca por ter apresentado em 2011 o menor índice médio de desemprego entre as sete grandes capitais monitoradas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) — apenas 3,7% da população economicamente ativa, ante a média de 6%. E o ano fechou com tendência de queda — apenas 3% em dezembro. Um dos resultados mais visíveis da abundância de opções de emprego é a pressão sobre os salários. A média na região de Curitiba entre a população empregada fechou o ano em 1 817,20 reais, aumento de 6,1% em relação a dezembro de 2010. Com isso, a remuneração oferecida na capital paranaense bateu até a média registrada na região metropolitana de São Paulo, que é de 1 755,50 reais.

Um dos setores que mais têm sofrido com o apagão da mão de obra é o de asseio e conservação. Não está fácil encontrar quem esteja disposto e disponível para trabalhar como copeiro, faxineiro e porteiro, os chamados “cargos de base”. “Há dois anos, era só anunciar que tínhamos vagas que as filas dobravam a esquina. Hoje é preciso sair panfletando em igrejas, feiras e supermercados”, conta o presidente do Sindicato das Empresas de Asseio e Conservação do Paraná, Adonai Arruda. O problema está estourando nas mãos das organizações fornecedoras desse tipo de mão de obra, que costuma ser terceirizada por grandes empresas, shoppings e hospitais. Há 5 000 vagas em aberto neste momento no estado, mesmo com o aumento de 15% nos salários, obtido pela categoria no ano passado, mais do que o dobro da inflação acumulada no período. “As pessoas ainda veem asseio e conservação apenas como um emprego de passagem, sem perspectiva de um vínculo de longo prazo. Nossa única saída é mudar esse estigma, oferecendo um pacote mais atraente e boas condições de trabalho”, diz Arruda.

Só a empresa dele, a Higi Serv, precisa contratar cerca de 250 pessoas por mês. Cinquenta são vagas novas e 200 são reposições, incluindo funcionários que entraram em férias, em algum tipo de licença ou pediram demissão para trabalhar em outro lugar. Dos 5 000 funcionários da Higi Serv, apenas 150 atuam em cargos administrativos. Os demais, em funções operacionais. “Nosso turnover mensal costumava ficar em torno de 3% e agora está em 8%”, diz Arruda. Para dar conta de tantas contratações, quatro pessoas foram convocadas para trabalhar exclusivamente com recrutamento. Além delas, os 12 supervisores operacionais têm como uma das atribuições prospectar possíveis candidatos indicados pelos subordinados -- parentes, amigos e vizinhos. A companhia decidiu premiar com uma cesta básica os funcionários que apresentem alguém para trabalhar.

Para tentar reduzir os custos das organizações com recrutamento e assegurar o mínimo de qualificação à mão de obra que chega verde ao mercado, a Fundação do Asseio e Conservação do Estado do Paraná (Facop) inaugurou no fim de janeiro o RH Coletivo, um sistema compartilhado de seleção e treinamento para as empresas do setor de limpeza — são 340 em todo o Paraná, envolvendo 19 categorias profissionais, incluindo jardineiros, ascensoristas, recepcionistas, porteiros e vigias. A expectativa é de que a oferta gratuita de um curso básico de oito horas, seguida da garantia de emprego, contribua para aumentar a chegada espontânea de trabalhadores ao setor.

Ofertas para todos os lados

Os esforços se justificam, pois a concorrência é mesmo grande: as indústrias reforçam o pacote de benefícios; o agronegócio atrai para o interior do estado; hotéis, restaurantes e bares também estão contratando; as confecções despontam como um setor cada vez mais importante para a economia paranaense; os call centers reduziram as exigências para a contratação; e a construção civil não para de se expandir na região de Curitiba. “Uma das características da mão de obra mais básica é que basta um pequeno ganho salarial, por menor que seja, para trocar de emprego. Em cargos mais qualificados, outros fatores são levados em conta e o percentual de ganho salarial precisa ser maior para que o profissional decida mudar”, diz Paulo Delgado, do Ipardes. Outra desvantagem do setor de asseio e conservação é a própria natureza dos empregos oferecidos -- muitos deles envolvem horários fora do padrão, já que shoppings, por exemplo, funcionam 24 horas por dia, sete dias por semana -- e as tarefas de limpeza e manutenção se acentuam depois que as lojas fecham. “Não é fácil estimular as pessoas a trabalhar às 3 horas da madrugada de domingo quando elas dispõem de alternativas em horários mais convencionais”, compara Adonai Arruda.

Também a construção civil sente as dificuldades de um setor em franco crescimento: o aeroporto está sendo ampliado, há obras no metrô e em estradas, três shopping centers e 35 000 unidades habitacionais em construção. Estima-se que 10% dos trabalhadores que atuam no setor na região de Curitiba tenham sido especialmente trazidos do Nordeste. “A retomada do segmento foi iniciada em 2006, depois de 25 anos de estagnação, e desde então não parou mais”, diz o engenheiro Frederico Hofius, gerente de engenharia da Plaenge, uma das principais construtoras locais. Aproximadamente 85% da mão de obra utilizada pela companhia é terceirizada, o que a obrigou a fortalecer os laços de “fidelidade” com os fornecedores. “Neste momento não dá para sair à procura do preço mais baixo, pois assim correríamos o risco de ficar sem ninguém. Oferecer aos parceiros remuneração justa e a garantia de que haverá trabalho permanentemente é o melhor negócio tanto para eles quanto para nós”, diz Hofius. Um dos resultados desse processo é o reajuste médio de 30% nos salários do setor de 2008 para cá.

Migrantes, imigrantes e até idosos

De acordo com Paulo Delgado, do Ipardes, a situação só não se tornou desesperadora para as empresas porque a economia paranaense ainda está absorvendo a mão de obra que estava na informalidade ó prestadores de serviços domésticos e vendedores ambulantes, por exemplo. A médio prazo, porém, diz o pesquisador, será preciso atrair a população de outros estados ou mesmo mão de obra estrangeira. Outros possíveis caminhos são ampliar o nível de ocupação da população mais idosa, já que os jovens estão entrando cada vez mais tarde no mercado de trabalho, e investir na modernização tecnológica, para mecanizar certas atividades.

A perspectiva é de que a dificuldade para encontrar mão de obra se irradie gradualmente para todo o estado. Nesse cenário, quem conseguir segurar seus colaboradores já estará indo muito bem. Com sede em Sertanópolis, a 450 quilômetros de Curitiba, a Moinho Globo, fabricante de produtos para uso doméstico e industrial, enfrenta a concorrência de grandes corporações que atuam na região, como a Seara, e já começa a sentir certa pressão da capital. Para evitar que as gigantes seduzam seus 170 funcionários, a organização aposta em um pacote de benefícios atraente e no bom ambiente de trabalho, fatores reconhecidos com a inclusão da companhia na edição mais recente do Guia VOCÊ S/A-EXAME – As Melhores Empresas para Você Trabalhar. Além disso, há a estratégia de fortalecer os vínculos dos colaboradores com o setor de atuação da organização. Uma das novidades é a Universidade do Pão, que oferece cursos técnicos ligados à panificação, mesmo para quem não exerce cargos diretamente ligados à arte de fazer pão. “As pessoas querem se sentir bem no trabalho e perceber que estão sempre aprendendo algo novo. Esses são os dois grandes trunfos de retenção”, diz Paulo Florêncio, diretor-geral da Moinho Globo.

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